Quando o crescimento econômico não gera o crescimento social, não há desenvolvimento. É dessa forma que podemos caracterizar o famoso período de nossa história conhecido como o "milagre econômico" que foi capitaneado pelo ministro Delfim Neto (que ficou conhecido pela frase: "temos que esperar o bolo crescer para depois distribuir os pedaços") durante o regime militar.
Durante o governo do general Amilio Garrastazu Médici, que assumiu em 1969 o crescimento econômico brasileiro chegou a ser superior a 10% do Produto Interno Bruto, o país crescia de forma otimista. As famosas políticas nacionalistas de Vargas e o desenvolvimentismo de Juscelino Kubitschek que culminaram em um grande investimento industrial e também na abertura econômica ao capital estrangeiro foi perpetuada pelos militares no período de ditadura e gerou a seguinte situação: quanto mais o país crescia econômicamente, a concentração de renda ampliava e a vida do povo piorava, elevando os índices de disparidade social.
Foi um momento muito ambíguo, pois ao lado do crescimento econômico, da geração de empregos e da instalação de multinacionais, as famílias dos trabalhadores tinham que conviver com a inflação, o arrocho salarial e a alta no preço dos alimentos. De fato, foi uma política que objetivava apenas o crescimento rápido, sem a mínima preocupação social. Um milagre para os economistas e uma trajédia para o povo brasileiro.
A medida que o sindicalismo e os movimentos sociais eram silenciados pelos militares, o capital estrangeiro penetrava nas terras brasileiras a fim de explorar as nossas riquezas. A industrialização e o desenvolvimento que gerava milhões de novos empregos nas empresas nacionais, estatais e multinacionais resultaria nos anos seguintes em um notável aumento do abismo social e na divida externa.
José Dantas explica esse período da seguinte forma:
Esse modelo econômico se baseou ma indústria de bens de consumo duráveis (automóveis, eletrodomésticos etc.) que, durante os efêmeros anos do milagre, experimentou elevado crescimento. Logo, a ilusão do milagre desvanesceu-se, ja que o mercado interno não incorporou os segmentos mais pobres da população como consumidores. (p271).
Diante desse cenário de crescimento econômico e exclusão social, os militares faziam da propaganda a sua principal ferramenta, principalmente porque, foi nesse período que as famílias oriundas da classe média passou a ter acesso aos aparelhos de TV. É válido ressaltar que foi nesse momento que a Rede Globo se expandiu para todo o país e passou a controlar o setor das comunicações, principalmente pelo fato da empresa ser uma fiel porta-voz das falsas propagandas governamentais, gerando no imaginário da população a falsa ideia de que o Brasil estava caminhando para o hall das grandes potências mundiais.
Outra descrição favorável sobre esse período se encontra na obra de Boris Fausto, onde o mesmo afirma que o fator negativo do milagre econômico foi de natureza social, pois de um lado, essa política permitiu uma grande acumulação de capital em detrimento dos salários da maioria dos trabalhadores. Outro aspecto negativo do "milagre" que perdurou depois dele foi a desproporção entre o avanço econômico e o retardamento ou mesmo, abandono dos programas sociais pelo Estado (FAUSTO. B p.269). O país durante a década de 1970 era caracterizado por altos índices de industrialização, ao lado de péssimos indicadores nos setores de educação, saúde e moradia.
E diante ese quadro social nada otimista, a ação dos movimentos populares foi primordial para aumentar a resistência política à ditadura militar que representava nada mais que, um capitalismo puramente selvagem. A insatisfação popular aumentava, a medida que os salários ficavam desvalorizados e o preço dos produtos, principalmente dos alimentos cresciam. Os empréstimos contraídos pelo país só faziam aumentar a nossa dependência pelos produtos importados.
Os empresários jogavam todo os prejuízos nas costas da classe trabalhadora e consequentemente, em suas famílias. E foi nesse momento de grande contradição que o movimento popular protagonizou um papel muito importante dentro da esfera política do país. As associações de bairros reinvidicavam por melhorias sociais, como mais escolas, creches, transportes públicos, esgoto, água encanada e hospitais. Por sua vez, os sindicatos lutavam contra os arroxos salariais. Assim o trabalhador brasileiro sentia na pele a política econômica gerida pela ditadura, seja no seu posto de trabalho, quanto no bairro que residia.
Isso gerou uma unificação das bandeiras de lutas dos movimentos comunitários e dos sindicatos e uma das maiores consequências desse fato foi a criação do Movimento Contra a Carestia em São Paulo e que logo se espalhou por outros estados como, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia e Rio Grande do Sul. O MCC era composto por pessoas ligadas ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e a Igreja Católica (É válido ressaltar que a CNBB escolheu o tema: "custo de vida" para a campanha da fraternidade de 1979). Foi um momento marcado por muita politização e organização, pois os trabalhadores que faziam o movimento sindical foram apoiados pelas lideranças comunitárias, que se organizavam em associações de bairros e em clube de mães. E assim, os trabalhadores, as lideranças comunitárias e as donas de casa passaram a tomar as ruas, distribuir panfletos nas feiras e nas fábricas, organizando a massa, tanto no local de trabalho, quanto nas suas moradias.
O MCC não se resumia apenas a realização de abaixo-assinado, panfletagem, manifestações e na organização de debates, mas outra prática merece grande destaque era as compras coletivas, onde as pessoas se reuniam e íam para a feira comprar frutas, verduras e legumes em uma grande quantidade por um preço mais baixo. Sobre essa prática, o advogado e militante do MCC na Bahia, Carlos Silveira escreveu em um artigo:
As compras coletivas aconteciam aos sábados, organizamos um grupo de pessoas interessadas, principalmente mulheres dos Bairros da Lama Preta e Triangulo e alugávamos um ônibus para irmos à Feira de São Joaquim, onde comprávamos os gêneros hortifrutigranjeiros em uma grande quantidade e repartíamos com todos os participantes. Assim conseguíamos um preço mais baixo e aproveitávamos para nos relacionarmos com aquelas pessoas do povo buscando ajudá-las a compreender que a situação política que vivíamos é que era a responsável pela carestia e que tínhamos de nos organizar e lutar para mudar aquela situação.
Estas compras coletivas tiveram grande importância não só pela incidência que tinha no fato de baixar o valor da nossa cesta básica, como pelo fator destas pessoas que iam se conscientizando e tornavam base política desta nova realidade que surgia em nossa cidade a partir daquela quadra da nossa historia.
Foi no MCC que as reivindicações e atuação das mulheres ganharam mais força contra a ditadura, principalmente quanto o movimento promoveu um grande abaixo-assinado para ser entregue ao presidente da república, para que o mesmo congelasse os preços. A movimentação ocorreu em todos os estados que o MCC estava presente e promovia mais debate sobre o mito do milagre econômico do governo dos generais. Milhares de trabalhadores, donas de casa, e estudantes assinaram o documento e participavam das plenarias promovidas pelo movimento. Logicamente que o governo reagiu com toda truculência possível, prendendo e reprimindo várias lideranças que divulgavam as bandeiras do Movimento Contra a Carestia.
Após várias atividades, o MCC chega a capital federal com o abaixo-assinado nas mãos. A ditadura militar presenciou pela primeira vez a força dos movimentos sociais. Infelizmente o documento não foi entregue ao presidente, contudo, o Movimento Contra a Carestia representou a força do povo brasileiro para a reconstrução de uma democracia participativa no país.
Referências:
DANTAS, José. História do Brasil.
FAUSTO, Boris. História Concisa do Brasil.
SILVEIRA, Carlos. 13 Anos de História do Movimento Popular de Camaçari de 1977/1989 (2). Disponível em: http://www.camacariagora.com.br/colunista.php?cod_colunista=37&cod_coluna=72
RIBAS, Cinthia. MCC - As Mães Contra a Ditadura. Artigo publicado na revista Visão Classista (Junho/2011).
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Quando o crescimento econômico não gera o crescimento social, não há desenvolvimento. É dessa forma que podemos caracterizar o famoso período de nossa história conhecido como o "milagre econômico" que foi capitaneado pelo ministro Delfim Neto (que ficou conhecido pela frase: "temos que esperar o bolo crescer para depois distribuir os pedaços") durante o regime militar.
Durante o governo do general Amilio Garrastazu Médici, que assumiu em 1969 o crescimento econômico brasileiro chegou a ser superior a 10% do Produto Interno Bruto, o país crescia de forma otimista. As famosas políticas nacionalistas de Vargas e o desenvolvimentismo de Juscelino Kubitschek que culminaram em um grande investimento industrial e também na abertura econômica ao capital estrangeiro foi perpetuada pelos militares no período de ditadura e gerou a seguinte situação: quanto mais o país crescia econômicamente, a concentração de renda ampliava e a vida do povo piorava, elevando os índices de disparidade social.
Foi um momento muito ambíguo, pois ao lado do crescimento econômico, da geração de empregos e da instalação de multinacionais, as famílias dos trabalhadores tinham que conviver com a inflação, o arrocho salarial e a alta no preço dos alimentos. De fato, foi uma política que objetivava apenas o crescimento rápido, sem a mínima preocupação social. Um milagre para os economistas e uma trajédia para o povo brasileiro.
A medida que o sindicalismo e os movimentos sociais eram silenciados pelos militares, o capital estrangeiro penetrava nas terras brasileiras a fim de explorar as nossas riquezas. A industrialização e o desenvolvimento que gerava milhões de novos empregos nas empresas nacionais, estatais e multinacionais resultaria nos anos seguintes em um notável aumento do abismo social e na divida externa.
José Dantas explica esse período da seguinte forma:
Esse modelo econômico se baseou ma indústria de bens de consumo duráveis (automóveis, eletrodomésticos etc.) que, durante os efêmeros anos do milagre, experimentou elevado crescimento. Logo, a ilusão do milagre desvanesceu-se, ja que o mercado interno não incorporou os segmentos mais pobres da população como consumidores. (p271).
Diante desse cenário de crescimento econômico e exclusão social, os militares faziam da propaganda a sua principal ferramenta, principalmente porque, foi nesse período que as famílias oriundas da classe média passou a ter acesso aos aparelhos de TV. É válido ressaltar que foi nesse momento que a Rede Globo se expandiu para todo o país e passou a controlar o setor das comunicações, principalmente pelo fato da empresa ser uma fiel porta-voz das falsas propagandas governamentais, gerando no imaginário da população a falsa ideia de que o Brasil estava caminhando para o hall das grandes potências mundiais.
Outra descrição favorável sobre esse período se encontra na obra de Boris Fausto, onde o mesmo afirma que o fator negativo do milagre econômico foi de natureza social, pois de um lado, essa política permitiu uma grande acumulação de capital em detrimento dos salários da maioria dos trabalhadores. Outro aspecto negativo do "milagre" que perdurou depois dele foi a desproporção entre o avanço econômico e o retardamento ou mesmo, abandono dos programas sociais pelo Estado (FAUSTO. B p.269). O país durante a década de 1970 era caracterizado por altos índices de industrialização, ao lado de péssimos indicadores nos setores de educação, saúde e moradia.
E diante ese quadro social nada otimista, a ação dos movimentos populares foi primordial para aumentar a resistência política à ditadura militar que representava nada mais que, um capitalismo puramente selvagem. A insatisfação popular aumentava, a medida que os salários ficavam desvalorizados e o preço dos produtos, principalmente dos alimentos cresciam. Os empréstimos contraídos pelo país só faziam aumentar a nossa dependência pelos produtos importados.
Os empresários jogavam todo os prejuízos nas costas da classe trabalhadora e consequentemente, em suas famílias. E foi nesse momento de grande contradição que o movimento popular protagonizou um papel muito importante dentro da esfera política do país. As associações de bairros reinvidicavam por melhorias sociais, como mais escolas, creches, transportes públicos, esgoto, água encanada e hospitais. Por sua vez, os sindicatos lutavam contra os arroxos salariais. Assim o trabalhador brasileiro sentia na pele a política econômica gerida pela ditadura, seja no seu posto de trabalho, quanto no bairro que residia.
Isso gerou uma unificação das bandeiras de lutas dos movimentos comunitários e dos sindicatos e uma das maiores consequências desse fato foi a criação do Movimento Contra a Carestia em São Paulo e que logo se espalhou por outros estados como, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia e Rio Grande do Sul. O MCC era composto por pessoas ligadas ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e a Igreja Católica (É válido ressaltar que a CNBB escolheu o tema: "custo de vida" para a campanha da fraternidade de 1979). Foi um momento marcado por muita politização e organização, pois os trabalhadores que faziam o movimento sindical foram apoiados pelas lideranças comunitárias, que se organizavam em associações de bairros e em clube de mães. E assim, os trabalhadores, as lideranças comunitárias e as donas de casa passaram a tomar as ruas, distribuir panfletos nas feiras e nas fábricas, organizando a massa, tanto no local de trabalho, quanto nas suas moradias.
O MCC não se resumia apenas a realização de abaixo-assinado, panfletagem, manifestações e na organização de debates, mas outra prática merece grande destaque era as compras coletivas, onde as pessoas se reuniam e íam para a feira comprar frutas, verduras e legumes em uma grande quantidade por um preço mais baixo. Sobre essa prática, o advogado e militante do MCC na Bahia, Carlos Silveira escreveu em um artigo:
As compras coletivas aconteciam aos sábados, organizamos um grupo de pessoas interessadas, principalmente mulheres dos Bairros da Lama Preta e Triangulo e alugávamos um ônibus para irmos à Feira de São Joaquim, onde comprávamos os gêneros hortifrutigranjeiros em uma grande quantidade e repartíamos com todos os participantes. Assim conseguíamos um preço mais baixo e aproveitávamos para nos relacionarmos com aquelas pessoas do povo buscando ajudá-las a compreender que a situação política que vivíamos é que era a responsável pela carestia e que tínhamos de nos organizar e lutar para mudar aquela situação.
Estas compras coletivas tiveram grande importância não só pela incidência que tinha no fato de baixar o valor da nossa cesta básica, como pelo fator destas pessoas que iam se conscientizando e tornavam base política desta nova realidade que surgia em nossa cidade a partir daquela quadra da nossa historia.
Foi no MCC que as reivindicações e atuação das mulheres ganharam mais força contra a ditadura, principalmente quanto o movimento promoveu um grande abaixo-assinado para ser entregue ao presidente da república, para que o mesmo congelasse os preços. A movimentação ocorreu em todos os estados que o MCC estava presente e promovia mais debate sobre o mito do milagre econômico do governo dos generais. Milhares de trabalhadores, donas de casa, e estudantes assinaram o documento e participavam das plenarias promovidas pelo movimento. Logicamente que o governo reagiu com toda truculência possível, prendendo e reprimindo várias lideranças que divulgavam as bandeiras do Movimento Contra a Carestia.
Após várias atividades, o MCC chega a capital federal com o abaixo-assinado nas mãos. A ditadura militar presenciou pela primeira vez a força dos movimentos sociais. Infelizmente o documento não foi entregue ao presidente, contudo, o Movimento Contra a Carestia representou a força do povo brasileiro para a reconstrução de uma democracia participativa no país.
Referências:
DANTAS, José. História do Brasil.
FAUSTO, Boris. História Concisa do Brasil.
SILVEIRA, Carlos. 13 Anos de História do Movimento Popular de Camaçari de 1977/1989 (2). Disponível em: http://www.camacariagora.com.br/colunista.php?cod_colunista=37&cod_coluna=72
RIBAS, Cinthia. MCC - As Mães Contra a Ditadura. Artigo publicado na revista Visão Classista (Junho/2011).
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